Somos constantemente confrontados com esta questão, quer
nas nossas reflexões pessoais, quer em conversas com amigos e conhecidos. São
muitas as observações que vamos fazendo do mundo, e as interpretações dos
acontecimentos que nos afligem e preocupam.
Perante o atual estado da situação mundial, não é,
realmente, difícil ceder à tentação de pôr em causa a crença de que o mundo e a
humanidade estejam a progredir. São as guerras intermináveis entre povos, que
parecem suceder-se umas às outras, sem que se estabeleça uma paz duradoira… São
o racismo e a xenofobia, que levam os países a fechar fronteiras e erguer muros…
São as lutas por um pedaço de chão que, enganosamente, achamos pertencer-nos
por direito… são os crimes de violência doméstica e maus tratos contra
crianças, a entrar-nos pela casa a dentro através dos meios de comunicação
social… É escravatura negra ou branca… O desrespeito pelos direitos dos outros…
A miséria ao lado do luxo extremo… A prepotência das maiores potências mundiais,
indiferentes à miséria que grassa mesmo ao lado… Os desastres ambientais e a
destruição do planeta, devido à busca incessante de lucros desenfreados… As
tecnologias modernas ao serviço da destruição das relações humanas, em vez de
ser foco de aproximação… As redes sociais ao serviço da maledicência e do
exibicionismo, quando poderiam e deveriam ser recurso para a partilha saudável…
Poderíamos ficar,
interminavelmente, a desfiar o rol de sinais que nos fazem perder alguma fé no
mundo, e perguntar: Mas em que está o Homem a transformar-se? É isto o
progresso?
Poderá a Doutrina Espírita, de alguma forma, ajudar-nos a
manter a esperança e a compreender o mundo tal como hoje se nos apresenta?
Certamente que sim. Se aprofundarmos o seu estudo, encontraremos na Codificação
valiosos recursos que auxiliarão a análise dos acontecimentos e ideias atuais e
orientarão a necessária reflexão.
Sim, porque é
reflexão que está a fazer falta, em muitos setores da Sociedade. Estamos, de
certa forma, a habituar-nos a agir por impulso, sem refletirmos nas
consequências dos nossos atos. Vivemos esquecidos do que verdadeiramente nos
trouxe a este mundo, nesta vida. Digo “esquecidos”. Esta é a palavra certa.
Ninguém, sejam quais forem as suas crenças, ou falta delas, tem a desculpa de
“não saber”. Todos já nascemos, morremos e renascemos neste mundo, vezes
incontáveis. Não é, para nenhum de nós, a primeira vez. Todos assumimos, mais
uma vez, como tantas outras, tarefas, missões, compromissos, de vária ordem, em
função do que teríamos de aprender, saldar, emendar, nas nossas personalidades
tendenciosamente afeitas mais ao Mal do que ao Bem. Todos, ao voltar, mais uma
vez, à vida terrena, buscávamos corrigir e aperfeiçoar a nossa personalidade e
aprender a viver de acordo com as Leis de Deus, por reconhecermos que só elas
nos facultarão uma vida plena e feliz. Todos estudámos e aprendemos, antes do
regresso, todos nos preparámos para o mundo que iríamos encontrar e para as
tarefas que teríamos de desempenhar. Se falhamos, mais uma vez, é porque nos
deixamos cegar pela matéria e preferimos o esquecimento. É sempre mais fácil
dizer “Se eu soubesse! Se tivesse sido esclarecido!” Mas não somos marinheiros
de primeira maré.
Perdemos tempo precioso e, com isso, estacionamos,
contribuindo para o progresso tão lento desta Humanidade a que pertencemos, e
que poderia estar já numa posição melhor, se nos empenhássemos nesse propósito.
Todos, sem exceção, já que, se estamos aqui e agora, é porque pertencemos a
esta ordem de coisas e dela necessitamos para a nossa própria evolução.
Façamos, então, uma breve reflexão, tomando como recurso o
capítulo VIII, Lei do Progresso, no
seu ponto II, Marcha do Progresso.
779. O
homem tira de si mesmo a energia progressiva ou o progresso não é mais do que o
resultado de um ensinamento?
- O
homem se desenvolve por si mesmo, naturalmente, mas nem todos progridem ao
mesmo tempo e da mesma maneira; é então que os mais adiantados ajudam os outros
a progredir pelo contacto social.
778. O
progresso moral segue sempre o progresso intelectual?
- É a
sua consequência, mas não segue sempre imediatamente.
780-a.
Como o progresso intelectual pode conduzir ao progresso moral?
-
Dando a compreensão do bem e do mal, pois então o homem pode escolher. O
desenvolvimento do livre arbítrio segue-se ao desenvolvimento da inteligência e
aumenta a responsabilidade do homem pelos seus atos.
780-b.
Como se explica, então, que os povos mais esclarecidos sejam frequentemente os
mais pervertidos?
- O
progresso completo é o alvo a atingir, mas os povos, como os indivíduos, não
chegam a ele senão passo a passo. Até que tenham desenvolvido o senso moral
eles podem servir-se da inteligência para fazer o mal. A moral e a inteligência
são duas forças que não se equilibram senão com o tempo.
Vemos, pelas respostas dos Espíritos às questões colocadas
por Allan Kardec, a necessidade de sublinhar o facto de inteligência e moral
dificilmente andarem a par. A inteligência precede a moral. É necessário que
assim seja para que o Homem tenha a capacidade de discernimento que o leve a
bem usar o livre arbítrio e consiga compreender e tirar conclusões a partir das
consequências dos seus atos. Vemos que atualmente a nossas sociedades estão a
atingir culminâncias intelectuais, em que o conhecimento, a tecnologia, a
ciência, evoluem a passos largos. Falta-nos aprender a usar todo esse
conhecimento de forma a beneficiar e melhorar as condições de todos, em vez de
nos guerrearmos. Colaborar em vez de competir. Amparar em vez de descriminar.
Em suma, falta-nos vencer o orgulho e o egoísmo que nos separam e entravam o
progresso pessoal e social.
Outro aspecto que chama a atenção nas respostas dos
Espíritos, é o que se refere à colaboração dos mais adiantados em relação aos
menos evoluídos. É o real motivo para nascermos e vivermos em sociedade:
partilha, colaboração, necessidade de aprendermos uns com os outros, quer
colhendo os bons exemplos, quer pela observação dos erros e suas consequências
que nos ensinam, levando-nos a evitar o que não serve porque provoca
sofrimento. Para toda essa aprendizagem, precisamos da ação do tempo, que
levará ao equilíbrio entre inteligência e moral.
781. É
permitido ao homem deter a marcha do progresso?
- Não,
mas pode entravá-la algumas vezes.
783. O
aperfeiçoamento da Humanidade segue sempre uma marcha progressiva e lenta?
- Há o
progresso regular que resulta da força das circunstâncias, mas quando um povo
não avança bastante rápido, Deus lhe provoca, de tempos a tempos, um abalo
físico ou moral que o transforma.
O que é dito sobre a marcha do progresso dos povos,
aplica-se igualmente à marcha individual. Temos a escolha nas nossas mãos.
Podemos progredir pelo estudo, pela prática do bem, ou seja, pelo conhecimento
e o amor, ou podemos necessitar dos abalos que a vida nos coloca no caminho,
como chamada de atenção, ou seja, pela dor. Somos os artífices do progresso,
quer pessoal quer da Humanidade terrena da qual fazemos parte.
A Lei de Progresso não permite regressões. O que
conquistamos é nosso. Mas… por quanto tempo mais estacionaremos num patamar de
expiação e prova, quando a estrada evolutiva é longa e se estende à nossa
frente com as promessas de felicidade e bem-aventurança apresentadas pelo
Mestre Jesus? A escolha é nossa. Quando o mérito exceder a necessidade de expiação,
quer a Terra, na sua generalidade, tenha avançado ou não, Deus nos colocará no
lugar adequado ao nosso estágio evolutivo. Mas, pelo contrário, a Terra poderá
avançar sem nós. Se assim for, seremos nós a ser afastados para mundos menos
evoluídos onde a nossa consciência continuará a ser trabalhada, pelo contacto
com aqueles com quem nos afinizamos e com quem deveremos colher experiências
enquanto colaboramos com os conhecimentos e qualidades que porventura tenhamos
já adquiridos.
Como diz Léon Denis, no seu livro “O porquê da vida”, “É conforme seus atos com as leis superiores
que o homem trabalhará eficazmente pelo seu próprio melhoramento e pelo da
sociedade… Quando se compenetrar da grandeza da sua missão, o ser humano saberá
desprender-se melhor daquilo que o rebaixa e abate; saberá governar-se
criteriosamente, preparar pelos seus esforços a união fecunda dos homens numa
grande família de irmãos”. Que bom será quando nos compenetrarmos disso!
Mais uma vez, a escolha é nossa. Estudemos, trabalhemos, afinizemo-nos com o Bem, enquanto estamos a caminho. Para isso, temos os ensinamentos do Mestre. Para isso, temos a Doutrina dos Espíritos. Não deixemos de aproveitar tão valiosos recursos!
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